quarta-feira, 31 de julho de 2013

Dia de 'se-lembrar'

Hoje Everaldo completaria 48 anos, empatando por um mês com Eliane que, pelas tradição de Bukingham, herdará a coroa lá de casa. Como ele foi habitar o eterno aos 32, fico olhando para as pessoas de 48, tentando pintar o irmão grisalho que não tive. O lugar mais certo de encontrá-lo, entretanto, é o meu próprio espelho e essa, de longe, é a melhor parte do rito diário de retocar a barba. Curioso como eu que gastei a infância e adolescência inventariando o quanto éramos diferentes, hoje não acho ninguém a quem eu me pareça mais. Tem dia que a semelhança é tanta que dou um risinho para o espelho, como uma saudação silenciosa e certa de que ele está por ali, como aqui, na parede à frente da mesa onde trabalho, entre as fotos da gente lá de casa que veio me dar solo nestas paragens ao Norte.
Meus sobrinhos são outro lugar de encontrar Everaldo, seja nos traços da Natália, na boa-gentice de Bruno e até na gaiatice do Arthur - sendo esses dois últimos os traços que me atiram no colo do pecado capital da inveja. Tenho certezas inabaláveis de que tudo ia ser um mar-de-rosas se me fosse dado trocar minha toupeirice pelo descolamento desses moços. Mas essa também pode ser mais uma das nossas semelhanças: achar que o "outro" tem os dons e os bem-quereres que nós próprios não gozamos, como tivemos, por sorte, oportunidade de rir do quanto um achava que o outro era o preferido de casa...
Meus motivos eram claros e razoáveis: nasci logo depois de uma dupla que inaugurou a vida de avós e tios dos dois lados da família, enquanto eu ocupava um lugar incerto de terceiro ou quarto lá de casa e já me embolava com a Flávia e a Carla na renca de netos e netas de seu Natal. Além do mais, Eliane e Everaldo eram crianças tão lindinhas, magrelas e docinhas, que me dá raiva até hoje. Eu, tipo parrudo, no corpo e na falta de humor, já não era pra brincadeiras e ainda fui turbinado com um curso avançado em palavrões oferecido por tio Nêgo... Nessa altura mamãe teve de jejuar um semestre sem poder ir à feita do sábado - evento marcante da vida social sambentense até hoje - por falta de quem voluntariamente corresse o risco de tomar conta de mim...
Sonhei muito rir dessas histórias com o Everaldo, quando a barba grisalha murchasse os dramas patrocinados pelos hormônios da puberdade. A vida, porém, tinha outro script e, então, eu tomo a contação de histórias como uma forma de desfrutar esse prazer.

4 comentários:

  1. Wal querido mais uma vez vc me encanta e emociona. Oxalá, muitos irmãos e irmãs pudessem ler esse texto carregado de sentimentos, saudades e poesias e assim poder revisitar lembranças e sentimentos esquecidos. Beijos e afetos sempre...

    ResponderExcluir
  2. Este comentário foi removido pelo autor.

    ResponderExcluir
  3. Admiro e invejo, boa, se é não há inveja boa, que os Deuses me perdoem! o dom desta pessoal incrível que traz em si um pouco de cada um dos dons desta família impar, e reflete em si a nobreza de antepassados desconhecidos, a sagacidade de superar dificuldades, o orgulho,não sei do que, e a beleza de ser e amar intensamente . Seus escritos são densos cheios de vieses que me levam a viagens incríveis, de ver o não visto e sentir intensamente o prazer de fazer parte da clã. Em meus sonhos vejo a publicação da história das nossas mulheres batalhadoras e do nosso irmão que com seu humor nos rodeia e acarinha e que mesmo separados, superaram as expectativas. Sobrinho obrigada, meu orgulho é grande e meu amor maior.

    ResponderExcluir
  4. Walderes, também estou impressionado por parecer com o cunhado-compadre...obrigado pelo terno.

    ResponderExcluir