sexta-feira, 24 de dezembro de 2010
"Yo tengo más que el leopardo..."
Para quebrar as tradições de natais e aniversários estereotipados, segui a pista dada pela própria aniversriante e investi esta manhã buscando uma versão suficientemente bonita dos versos de José Marti com que ela nos recordou do seu aniversário deste ano. Célia Cruz? Raízes de América? The Sandpipers? Buena Vista Social Club? Nana Mouscouri e Joe Dassin? Não consegui escolher a mais vibrante, mais bonita, mais tocante... Seria um presente para ela, terminou sendo um presente para mim. Recomendo, de qualquer forma, que curta todas e muitas outras versões disponíveis, com as quais celebro, hoje, a tua vida, CIDA ALVES!
terça-feira, 14 de dezembro de 2010
Lavras e louvores
Fotografias: Wolney Fernandes de Oliveira
A visita a um museu pode ser uma profunda experiência mística – sei disso, visceralmente, desde o mês passado, quando o Museu Antropológico da UFG me abriu as portas (e muitas portas e janelas em mim) para “Lavras e Louvores”, exposição de longa duração, com curadoria das antropólogas Selma Sena e Nei Clara de Lima, professoras da UFG. Recomendo, vivamente, que não entrem na sala antes de ler o conceito da exposição que não apenas nos prepara para a experiência quanto, em sintéticos dois parágrafos expostas à esquerda da entrada, põe em frangalhos nosso linear-progressivo-rígido e equivocado modo de enxergar as temporalidades e de convencionar fronteiras de todas as naturezas. O choque do texto tem o condão de fazer ver, em nós e no mundo, como e quanto o presente, o passado e o devir mesclam-se numa complexa e envolvente tecitura.
Quando ultrapassar o batente, você terá os pés postos na cintura de um “oito” ou de um sinal matemático de “infinito”, e será silenciosamente convidado a caminhar à direita ou à esquerda, conforme mandem as ancestralidades que habitam o que corpo que você é. As minhas me arrastaram ao caminho das lavras, num movimento que me conduziu da penumbra para a iluminação e da audição de uma espécie de sofejo para uma música marcadamente indígena – ambas tornadas plenas quando se chega à cabeça ou aos pés do “oito” ou do “infinito” – lugar ladeado por um painel de cobertas tecidas, quem sabe, pela mãe ou pela avó de qualquer de nós, porque dificilmente não há em nosso repertório a memória de ao menos um sono acalentado sob uma daquelas sofisticadas tramas e padrões.
Outra vez na cintura do “oito”, dê um passo à frente e se detenha para contemplar o portal em arco de flores de papel suspensas sobre a sua cabeça, num tempo e num espaço nos quais, seguramente, habitamos: hora dos louvores! Como estava sozinho, não tive vergonha de evoluir dançando: é que não consegui me mover neste quadrante a não ser na cadência das caixas e do canto dos foliões que crescia ao fundo.
E o fundo não era o fim. Depois dele, uma passagem de finas cortinas coloridas, transparentes, sobrepostas impediam a visão ao mesmo tempo em que insinuavam o além. Resolvi me arriscar por entre os tules e esbarrei em altares de todas as divindades. Na lateral à esquerda, o único lugar a plena luz, me arrastou para o insigt definitivo: um cubículo com espelhos, recobertos por fotos vazadas de pessoas, dispostas numa espécie de jogo da velha, completado apenas com a inserção da nossa própria cara refletida, compondo o quadro da diversidade das gentes do sertão. Caminhei com esse “sentido” mais uma vez através da sacralidade, despedi-me da folia, não sem antes admirar as rendas e os dourados de Oxun das águas doces de outras e também destas paragens. Uma vez mais na cintura do “infinito” tanto fazia refazer o caminho das “Lavras e Louvores” quanto transbordar para a vida: nada mais podia ser como antes.
Museu Antropológico da UFG
Exposição Lavras e Louvores
Praça Universitária
Terça a sexta, 9 às 17h00
sexta-feira, 26 de novembro de 2010
Sobre negros e viados
Gosto de televisão e gosto de dirigir ouvindo qualquer coisa da CBN. Ontem à noite, me emocionei, no Cladestinos, com o Quixote de Pedro Gracindo e me indignei com a verdade desnuda na conversa de 60 segundos travada por Júnior e Eduardo, dois atores negros, sobre o racismo no Brasil, inclusive no campo da arte. Hoje depois do almoço, foi a vez que me indignar com o cinismo homofóbico reiterado de um deputado do qual não escrevo nem o nome (para não gerar pontos para o infeliz nas buscas do Google), mas me identifico plenamente com a justificada indignação da comentarista Rosean Kennedy sobre o episódio. Como respeitar um parlamento que põe um sujeito dessa espécie na Comissão de Direitos Humanos de Minorias?
Aqui vai a "crônica do planalto" e abaixo o trechinho de Clandestinos.
quinta-feira, 18 de novembro de 2010
Agendado com antecedência
Não ficou definido o dia, mas está escrito no meu cartão de vacinas (sim, eu tenho um!) que devo voltar ao posto de saúde, em novembro de 2020, para mais uma dose contra a febre amarela. O compromisso foi marcado ontem, depois de 17 páginas de espera (porque ultimamente meu tempo em filas se mede por páginas lidas), junto com uma dúzia de bebês. Os mais velhos éramos o Pedro e eu: ele com 4 e eu com 42... Antes de mim, foram a Sarah e o Miguel, ambos na fase em que se acorda às 11 da manhã, apenas quando agulhas ferem o bumbum ou algo com semelhante gravidade. Nem barulho, nem calor, nada atrapalha a modorna... Júlia e Maria Eduarda, que chegaram depois de mim, já tinham comportamento de gente grande. A primeira na fase hippie, rindo para todo mundo, mesmo para os de cara feia, com quem eu brinquei de esconde-esconde atrás de "A virada cultural", de Fredric Jameson. A segunda, mais gente grande ainda, não aguentava nem ficar no corredor: eram os pais irem se aproximando, ela abria o berreiro e apontava para a porta de saída aos prantos e a plenos pulmões: sabia que aquele lugar não reservava coisa que preste; melhor pular fora.
"Pais", aliás, é força ondorcêntrica do hábito, porque quem fica nos corredores dos postos de saúde, quem segura as pernas dos filhos para tomar vacina são as "mães". Ontem, por exemplo, os pais eram tantos quantos as avós: três, no máximo, e nenhum estava só e tampouco aceitou entrar na sala das agulhadas: "Com tanto conhecimento que existe", reclamou a mãe do Miguel, "e ainda não inventaram nada para evitar essa tortura com os pobrezinhos: devia ter um jeito de imunizá-los ainda na barriga da mãe".
Nunca tinha pensado nisso, certamente porque nunca precisei segurar pernas de bebês em vacinação, mas concordei na hora. Na hora e logo depois também, quando foi a minha vez de tomar uma no braço direito e outra no esquerdo, após de uma conferência entre as enfermeiras, que sentenciaram a isenção do meu traseiro para a empreitada. Sem falar em que novembro de 2020, além de ter dia de finados e proclamação da república em pleno final de semana, ainda terei de repetir a dose... Ninguém merece!
quinta-feira, 11 de novembro de 2010
Mulheres sobre Mulheres
Sem mais delongas, senhoras e senhores, primeiro Mônica Waldvogel, Marta Suplicy e Fátima Pacheco Jordão e, em seguida, Eliane Gonçalves!
Agora, sim, leia o texto a Eliane Gonçalves.
terça-feira, 2 de novembro de 2010
Fui assinante de Veja!
terça-feira, 19 de outubro de 2010
Pensando com Luiz Mello
Queremos casar. Fazemos abortos. Mudamos de sexo.
Amamos viados. Mulheres são nosso ideal.
E, mais que tudo, existimos e resistimos.
SOMOS LÉSBICAS, TRAVESTIS, GAYS E TRANSEXUAIS. SOMOS MULHERES E FAZEMOS ABORTOS. REIVINDICAMOS ACESSO IGUALITÁRIO AO CASAMENTO, À UNIÃO ESTÁVEL, AO DIVÓRCIO, À INSEMINAÇÃO ARTIFICIAL, À BARRIGA DE ALUGUEL, À ADOÇÃO. QUEREMOS TER DOIS PAIS HOMENS OU DUAS MÃES MULHERES. SOMOS CATÓLICOS-AGNÓSTICOS-UMBANDISTAS-EVANGÉLICOS-ATEUS E ESTAMOS EM TODOS OS LUGARES.
Não há nenhuma necessidade real de pertencermos a qualquer desses grupos ou de desejarmos usufruir qualquer dos direitos que lhes são negados. O fundamental é ter a clareza de que não se trata apenas de uma ameaça à cidadania e mesmo à sobrevivência física de pessoas homossexuais, travestis, transexuais e de mulheres heterossexuais, embora a garantia de seus direitos humanos seja um imperativo absoluto. Num nível além das aparências mesquinhas, o que está em jogo é algo precioso para todas as pessoas, por serem princípios fundamentais da vida democrática: a laicidade do Estado, a liberdade e autonomia dos indivíduos, a garantia da igualdade na esfera pública.
Não sei se é lenda, mas há alguns anos ouvi uma história incrível: quando os nazistas invadiram a Dinamarca, não conseguiram prender grande número de gays e lésbicas, diferentemente do que ocorreu em muitos outros países durante a segunda guerra mundial. Antes que as prisões se tornassem um fato irremediável, centenas de milhares de dinamarqueses começaram a usar voluntariamente em suas roupas o símbolo do triângulo rosa invertido, empregado por nazistas para identificar homossexuais nos campos de concentração. A solidariedade foi a fonte da resistência. Não é à toda que muitos anos depois a Dinamarca tornou-se o berço dos direitos conjugais de lésbicas e gays na contemporaneidade.
Apenas por muito pouco estamos hoje distantes das mãos dos que se sentem no direito de dizer quem deve e quem não deve viver – e como viver -, seja por razões de Estado, seja por razões religiosas. Isso é inaceitável. Quando um grupo de pessoas se vê na iminência de perder direitos de cidadania e humanos por terem se tornado o bode expiatório da vez, toda a estrutura democrática da convivência humana está ameaçada. Num momento em que o machismo homofóbico é nitroglicerina pura e o combustível ideológico das igrejas nas disputas de poder relacionadas a um projeto de sociedade que nega direitos sexuais e reprodutivos a grupos específicos, um caminho de resistência talvez seja dizermos que somos tod@s ess@ outr@ que querem calar, castrar, excluir e aniquilar. E é urgente fazermos isso agora, desobedientemente, sem medo de assumirmos politicamente a rebeldia do oprimido que se revolta e não aceita as bases da vida desumanizada que lhe está sendo imposta. Se nos calarmos neste momento, talvez amanhã não possamos dizer mais nada.
Luiz Mello
Pesquisador do Ser-Tão e
Professor da Universidade Federal de Goiás
quinta-feira, 14 de outubro de 2010
Da sacola pra dentro
"Você nunca sabe o dia em que vai encontrar o amor da sua vida. Por isso, nenhum aviso, nenhuma premonição ou intuição me preparou para aquela noite fria de maio. Como já faz tempo que isso aconteceu, posso falar agora, em detalhes, sobre o momento que antecede o encontro com o amor de sua vida. Sobre os segundos que separam sua existência até ali do resto dela. Trata-se, entendam, de um tempo muito peculiar, medido em frações de segundos. Trata-se de uma fenda temporal, mais exatamente. Mas, se você ficar atento, conseguirá, depois que tudo passar, lembrar de cada um dos detalhes, como eu faço agora."
terça-feira, 12 de outubro de 2010
domingo, 22 de agosto de 2010
A freira e o namorado
"[...] Consumiste-me com as tuas assíduas perseveranças; ...inflamaste-me com os teus transportes, encantaste-me com as tuas finezas; ...asseguraste-me com os teus juramentos; ...a minha inclinação violenta seduziu-me, e as consequências destes começos, tão agradáveis, e tão venturosos, não são mais do que lágrimas, gemidos, e uma funesta morte, sem que possa achar-lhe algum remédio!"
Imagem captada de: http://www.museuregionaldebeja.net/sorormarianaalcoforado.htm
domingo, 15 de agosto de 2010
A cor da miséria
domingo, 8 de agosto de 2010
Mané de Jorge
Em janeiro meu pai completou 70 anos e eu não pude participar da festa. Hoje é dia dos pais e eu estou a 2 mil quilômetro... Não custa correr o risco de enviar, outra vez, a mesma "carta" ridícula...
"Todas as cartas de amor são
ridículas.
Não seriam cartas de amor se não fossem
ridículas.
Também escrevi em meu tempo cartas de amor,
como as outras,
ridículas.
As cartas de amor, se há amor,
têm de ser
ridículas.
Quem me dera no tempo em que escrevia
sem dar por isso
cartas de amor
ridículas.
Afinal,
só as criaturas que nunca escreveram
cartas de amor,
é que são
ridículas."
(Trecho do poema "Todas as cartas de amor são",
de Álvaro de Campos, um dos heterônimos de Fernando Pessoa)
segunda-feira, 2 de agosto de 2010
22. CHAGA - "Buraco do Tatu"
sexta-feira, 28 de maio de 2010
"variações" quali-quanti
Já passou uma semana da entrega do primeiro exercício de Métodos e Técnicas de Pesquisa, a respeito de abordagens quantitativas e eu ainda me sinto algo assim entre bêbado e mareado. Todo o negócio começa pela compreensão de que mesmo um objeto qualitativo pode ser abordado quantitativamente, desde que a observação seja feita não do objeto propriamente, mas das variáveis que o compõe. No caso do nosso exercício, a pesquisa já havia sido feita, as variáveis estavam determinadas, os dados estavam tabulados no SPSS (Statistical Package for the Social Sciences) e guardados no CIS (Consórcio de Informações Sociais). Nossa tarefa era simplesmente cruzar todos os dados, identificar a significância estatística e a força de associação da intersecção de variáveis da tabela de contingências, com base na leitura do R de Pierson, do SIGMA, do LABDA ou do GAMA, dependendo do caso das variáveis serem discretas ou contínuas, nominais ou ordinais, entendeu?
É! Acho que eu também não... E o pior é que ainda fico com uma vontadezinha-quase-comichão de me meter nessa roubada de decifrar os enigmas das ferramentas quantitativas em aproximações de problemas do campo das Ciências Sociais.
quinta-feira, 13 de maio de 2010
Desimportantes exuberâncias
segunda-feira, 3 de maio de 2010
Desfiando e tecendo
sábado, 1 de maio de 2010
21. INVISÍVEL - E bem real
segunda-feira, 26 de abril de 2010
domingo, 25 de abril de 2010
sexta-feira, 2 de abril de 2010
Paixão de vó Dorica
terça-feira, 23 de março de 2010
segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010
18. CANTO - Secretamente compartilhado
Desde então, arrastei essa mala para debaixo da minha cama por três ou quatro casas para as quais nos mudamos, através da minha infância-puberdade-adolescência e juventude... Nela cabia, em segredo e síntese, tudo que habitava em mim: coleção de tampas de margarida de super heróis; álbuns de figurinhas invariavelmente inconclusos; pacotes de gibis comprados, nos sábados que eu podia ir do sítio à feira, na banca do seu Genésio e da dona Marli, com predomínio da turma do Bolinha e da Luluzinha, com suas mães de peitos fartos e bundas murchas, vendas de limonada em caixote, com rã atirada dentro da jarra e brigas com a turma da zona norte... Também tinha coleção de meia dúzia de chaveiros e um inútil “compacto” de história infantil numa casa sem vitrola.
Entre outras relíquias, que eu julgava invioladas, embora a mala não tivesse chave, uma “milhaeira” de cerâmica em forma e cor de moranga, onde eu guardava minhas moedas e que, soube muito mais tarde, era o mesmo lugar de onde Vanuzia e Amanda, minha irmã e prima quase gêmeas, com uma faca de mesa e muita habilidade, tiravam toda tarde, no meu horário de aula, o soldo para financiar esbórnias de picolés e pipocas com textura de isopor, disponíveis na banca do seu Babá.
Esta, porém, já é outra história, ainda sem suficiente acerto de contas...
quarta-feira, 20 de janeiro de 2010
Cidadela
domingo, 17 de janeiro de 2010
Oran e Porto Príncipe
Foto: ONU/ Divulgação: uol
Ouço, vejo, penso e estremeço com as notícias do Haiti, sem consegui me desligar do enredo de “A Peste”, lido nos dois primeiros dias deste ano. A velocidade da leitura, nesse caso, se deveu menos a minha voracidade de leitor e mais à perícia de Michel Camus na condução da narrativa, produzindo em quem a lê a mesma tensão de quem está aprisionado num lugar açoitado pela “peste”.
Narrado em terceira pessoa, embora pudesse ter sido feita em primeira, como se revela no epílogo, “A Peste” tem a particularidade de ser um relato de homens, quiçá porque seja predominantemente de varões a autoria das bestialidades do nazismo sobre a França de outrora, de que o livro seria uma parábola, como bem poderia sê-lo da não menos cruel a calculada pauperização de muitos povos, de há muito e até à nossa geração, entre eles o Haiti.
O cenário é descrito como uma cidade comum que não passaria de uma “prefeitura francesa na costa argelina”, por onde as personagens evoluem da cínica indiferença à desesperada ação coletiva solidária, ao sabor das ondas da morte que engolfam a todos, começando pelos ratos e chegando aos notáveis, como políticos, juízes e clérigos.
Envolvente e irresistível, a peste verga a gente para o bem e para o mal. À medida que avança, dessacraliza ritos e brutaliza pessoas, enquanto a outras humaniza mais funda e definitivamente. Após sua sinistra jornada, a peste vai embora tão arbitrariamente quando chegou e deixa sobre Oran a dúvida, ameaça ou certeza com que Camus encerra a obra: “Um dia acordará os seus ratos e os mandará morrer numa cidade feliz”.