Comprei passagem com meses de antecedência, porque éramos dois (Rezende e eu) e porque, por arte do diabo, nossas folgas sempre coincidem com altas temporadas... Na época, a TAM estava com os melhores preços - o que é quase um milagre. Eu mesmo já estava preparadíssimo para fazer um daqueles percursos Goiânia-Taubaté-Coxim-Avelinópolis-Santana do Livramento-Jupi(finalmente)-Recife, com 19 atrasos em decolagem, simulação de máscaras caindo na minha frente, entre outros velhos ritos, customizados por uma das novas companhias surgidas na esteira da GOL, na era da viagem aérea regada a "pepsi e guaraná, normal e zero, biscoito ou amendoim, pronto e acabou-se".
Numa das raríssimas vezes que conseguimos ser pontuais, chegamos ao aeroporto Santa Genoveva, nome que (injustificadamente) exala provincianismo, e fomos meteoricamente inserimos na modernidade cosmopolita da democracia globalizante do overbooking: "Tivemos um problema de manutenção em nossa aeronave e os senhores estão remanejados para um voo da AZUL" - disse a "aérea-moça". Deu vontade de xingar, espernear, chamar a imprensa... enquanto ela, acostumada à cena, não moveu um músculo até que, resignados e sem fazer nada, dissemos "sim". Era isso ou viajar por outra companhia e ampliar de 4 para 5 as horas de atraso.
O ódio de ficar impotente foi logo dissipado pela companhia da Keli, da Vanessa e do Rafael, que retornavam à São Paulo, depois do último módulo da Especialização em Juventude. Depois disso, sem sobressaltos nem sacolejos, chegamos aos Guararapes e papai nos esperava num carro do qual não tentarei explicar a propriedade, para não precisar remontar à Abraão numa espécie de genealogia de empréstimos, socorros e generosidades amplamente praticados nestas paragens. O possante, que "morrera" bem na chegada ao aeroporto, conseguiu dar a partida, fazer a curva sobre um viaduto no sentido Engenho do Meio, num esforço suficiente para ele "morrer" (dessa vez em definitivo) enquanto estávamos justo na terceira de uma avenida de 6 faixas, bem em frente ao aeroporto.
Lembrei na hora que a Rosi, o Israel e o Wolney, por um triz, estariam ali, e que o episódio de empurrar o carro para o canteiro central, depois atravessar as faixas (empurrando outra vez), para em seguida atravessar à ultima via (empurrando sempre, claro) dessa vez numa curva e na contramão para, finalmente, largar o veículo num posto de gasolina, seria uma forma perfeita de inseri-los no astral da minha terra.
Tudo foi feito, claro, na velha tradição familiar: com muita "mangação" das nossas próprias desventuras. Em casa nos esperava um bocado de parentes e um tanto variado e farto de comida. Pela ordem, mamãe, duas irmãs (Cris e Vanuzia), uma tia (Stella), duas primas (Amanda e Fernanda), um cunhado (Carlos), três sobrinhas (Fedra, Zara e Amanda), uma amiga (Maria), três primos em trânsito (Willian, Rui e a filha - de quem não gravei o nome) e é possível que mais alguém que me escapou da memória. Para comer: xerém com leite ou com galinha ao molho, cuscuz, bolo de mandioca, bolo de chocolate, bolo de ameixa, queijo de qualho, além outras coisinhas ordinárias, sempre disponíveis nas casas do meu pessoal.
Para fechar a recepção, conversamos até às 2 da manhã, no horário de Deus - mas esse já era o dia seguinte, sobre o qual contarei algumas detalhes logo mais.